Nas últimas horas, ficámos a saber algumas coisas.
1. Vem aí um governo de unidade nacional na Grécia. Provavelmente liderado por um tecnocrata não eleito que, coincidência das coincidências, foi vice-presidente do BCE entre 2002 e 2010.
2. Haverá eleições na Grécia. Ou melhor, haverá um referendo ao austeritarismo com as seguintes opções: "quer a sua austeridade com sotaque conservador? vote Antonis Samaras" ou "quer a sua austeridade com sotaque social-democrata? vote Evangelos Venizelos".
3. A reestruturação "ordeira" da dívida grega continua sem ser sustentada por um programa legível e estruturado. Quanto melhor se conhecem as condições, pior parece a solução. A conclusão preliminar: o duo dinâmico Paris-Berlim tem piores analistas e decisores do que parecia até agora.
4. Para usar um jargão conhecido dos institucionalistas em estudos políticos, toda esta confusão parece ter criado uma dependência de trajectória e uma dinâmica de retorno crescente que funcionarão como obstáculos à implementação das reformas (quanto mais a transição sistémica) necessárias à sobrevivência da UE como a conhecemos e a qualquer mudança de paradigma. As instituições europeias não estão preparadas ou vocacionadas para abalos sísmicos no mundo sub-comunitário, vulgo procedimentos democráticos substantivos, ou para cisnes negros, como a declaração repentina de um PM grego com uma agenda específica.
5. A capa do Jornal de Negócios ilustra aquilo que tinha dito. A máquina de spin já começou a funcionar. Os gregos, esses ingratos de merda, essas pútridas tumefacções pecadoras-gastadoras-devedoras, ainda têm o atrevimento de questionar? Quem deve, aceita. Quem deve obedece a quem lhe emprestou. É assim a gente honrada, foi assim que aprendemos. E eis como a origem moral do conceito de dívida reemerge. Esses porcos comedores de queijo feta, desavergonhados!
6. Amanhã, quer-me parecer que Papandreou tomará o seu lugar como eminência parda e dará o lugar a Venizelos. Samaras - esse grande estadista, nas palavras do Pedro Magalhães - já afirmou que a Nova Democracia não aceita Papandreou.
7. A cúpula da União Europeia, na sua estupidez insana, desatou a falar da saída do euro. A Comissão apressou-se a indicar o óbvio: o TFEU não prescreve mecanismos de expulsão ou saída voluntária da UEM ou da UE. Mas Merkel e Sarkozý, essas inenarráveis alimárias embrutecidas, não se coibiram de abordar o tema da moeda única e da possível saída da Grécia. As consequências serão imprevisíveis, mas sabemos isto: com esta liderança, a UE está fadada a um desaparecimento autofágico.
Amanhã o povo grego entra numa nova fase de combate. Convém não tirar isto da cabeça: a sociedade grega enfrenta um processo de desagregação. Não há julgamentos políticos anteriores ou ulteriores: se há gente a morrer e redes sociais a desaparecer, o resto é acessório.
Edit 1: Estava enganado, a CE também atirou achas à fogueira. Está tudo doido.
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