domingo, 31 de julho de 2011

Lições de Democracia sobre Dívida Pública Vindas dos Países em Desenvolvimento

Costas Lapavitsas | The Guardian

Décadas de experiências amargas com crises financeiras permitiram aprender várias lições. Uma é que acordos com organizações multilaterais, sobretudo o FMI, devem ser evitados.

A dívida pública tornou-se um ponto central da actual crise económica, servindo para justificar políticas que cortam na despesa pública, pressionam a descida dos salários e o aumento do desemprego. Mas, a dívida pública também levanta questões de âmbito democrático. O que é que as pessoas que trabalham – as famílias trabalhadoras, as favoritas dos políticos britânicos – sabem sobre as suas causas e composição? A resposta provavelmente é: quase nada. Com que base é que são então forçadas a cumprir duros sacrifícios, presumivelmente, para controlar a dívida pública?
As eleições não são solução, mesmo quando um governo é eleito de forma expressiva e lhe é dada carta-branca em relação à dívida, como aconteceu com o Partido Conservador no Reino Unido. As plataformas eleitorais pouco mais oferecem do que argumentos gerais, por vezes ideológicos, sobre as implicações da dívida. A realidade é que a dívida pública é de uma natureza complexa, que continua a ser, na sua maioria, de contornos obscuros para os eleitores.
Outras questões do foro democrático prendem-se com as repercussões sociais da dívida pública. Os detentores de títulos públicos reivindicam parte do produto anual de um país, colectado pelo Estado através de impostos. De facto, a dívida pública actua como um mecanismo de transferência de receitas e riqueza entre classes sociais e nações. Parece por isso fundamental que aqueles que são chamados a suportar o esforço do serviço da dívida tenham uma voz activa na sua gestão. A dívida pública é demasiado importante para ser deixada nas mãos de tecnocratas não eleitos ou mesmo de políticos que visivelmente ignoram a sua natureza.
Mas será que existe alguma maneira de pôr em prática o direito democrático ao conhecimento e participação activa na forma de lidar com a dívida pública? Uma resposta pode ser extraída da experiência recente dos países em desenvolvimento.
A actual crise é a terceira maior reviravolta financeira a atingir a economia mundial desde o início da liberalização financeira dos anos 70. A primeira, nos anos 80, devastou a América Latina e o Bloco de Leste. A segunda, nos anos 90, atingiu os «tigres» asiáticos, mas também a Rússia, a Argentina e a Turquia. O desastre que começou em 2007, por outro lado, afectou o núcleo do sistema económico e financeiro global, principalmente a UE, os EUA e o Reino Unido.
As três crises estão associadas àquilo a que chamamos «financeirização do capitalismo», e exibem, por isso, padrões comuns. Os países atingidos passaram geralmente um periodo de grande crescimento do crédito doméstico, mas também dos pedidos de empréstimo ao estrangeiro. O crédito, interno e externo, foi frequentemente direccionado para a especulação imobiliária, transacções financeiras e consumo, em vez da produção. Quando a inevitável crise rebentou, os devedores ficaram com largas dívidas, internas e externas, privadas e públicas. Vieram as organizações multilaterais, impondo austeridade, protegendo os interesses dos credores e transferindo os custos da dívida para a sociedade em geral. O resultado foram anos de decréscimo nas receitas e muito desemprego.
Décadas de experiências amargas permitiram aprender várias lições, três das quais merecem ser mencionadas. Em primeiro lugar, acordos com organizações multilaterais, sobretudo o Fundo Monetário Internacional (FMI), devem ser evitados. Políticas de estabilização levam à estagnação, e para um crescimento sustentável é melhor manter o FMI à distância.
Em segundo lugar, o mecanismo internacional para lidar com a dívida favorece os credores, tipicamente os grandes bancos e outros detentores de títulos. Um alívio eficaz da dívida requer a intervenção soberana dos devedores, de forma a obter uma anulação substancial. Para além do mais, requer a cooperação internacional entre devedores.
Em terceiro lugar, a protecção dos interesses de quem pede emprestado funciona melhor caso uma boa parte das pessoas esteja envolvida, numa base democrática. Uma inovação importante tem sido a formação de comissões independentes de auditoria – geralmente a partir de movimentos populares – que exigem acesso livre à informação. Uma comissão de auditoria poderia examinar a dívida pública relativamente à sua legalidade, legitimidade, e sustentabilidade social, e verificar se é odiosa, promovendo assim a base para a sua anulação.
Escusado será dizer que a conjuntura social e política é diferente nos países desenvolvidos em comparação com os países em desenvolvimento. Mas o direito democrático de examinar a dívida pública de uma forma independente, com o objectivo de advogar políticas radicais e consequentes para a sua gestão, incluindo a anulação, é o mesmo. Há sinais de que esta lição dos países em desenvolvimento é cada vez mais apreciada na Europa, começando pela Grécia, mas também na Irlanda, em Portugal, França e noutros países. Esperemos que as pessoas trabalhadoras nos países desenvolvidos encontrem a força para lançar a arma democrática das comissões de auditoria no combate à dívida pública.

Tradução de Francisco Venes

sexta-feira, 29 de julho de 2011

A Crise É Um Negócio

Nuno Ramos de Almeida | i

O milionário Warren Buffett, o terceiro homem mais rico do mundo de 2011 segundo a revista Forbes, comentou um dia as reduções multimilionárias aos impostos dos mais ricos dos EUA, fazendo notar que a sua empregada doméstica tinha uma taxa de imposto maior que ele. Para Buffett era claro que se vive uma guerra de classes e que, diz ainda, a classe dele «está a ganhar esta guerra.» Quando ouvimos que a crise toca a todos e que é uma espécie de peste negra que une a pátria esbaforida em uníssono, devemos perceber que no barco não estamos todos. Parte daqueles cujos interesses comandaram o Titanic luso já estão em bom porto. Segundo a revista Exame, os ricos estão mais ricos. As 25 maiores fortunas em Portugal somam 17,4 mil milhões de euros, 10,1% do PIB português, o que corresponde a uma subida de 17,8% face a 2010 . Quando nos falam em crise pedem-nos sacrifícios, mas são sempre os mesmos que os fazem. Quem trabalha vai passar a ser despedido com uma mão à frente e outra atrás, os transportes vão aumentar, a saúde será tendencialmente paga a preço de custo e o ensino superior será só para quem tem dinheiro. Esta crise é uma revolução política que dará aos mais ricos todo o poder e muito mais dinheiro. 
Nuno Bragança escreveu em A Noite e o Riso: «Os pobres são os degraus da escada que conduz os ricos ao céu.» Uma coisa é certa, no fim desta crise os ricos estarão no paraíso. Adivinhe quem vai estar no inferno.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Stiglitz no Fórum Social do 15-M

Carlos Limón | Publico.es

O prémio Nobel da Economia, Joseph Stiglitz, veio ao Fórum Social do 15-M para analisar a situação política e económica actual.Era segredo. Um convidado inesperado foi a surpresa no primeiro Fórum Social do 15-M. O pŕemio Nobel da Economia, Joseph Stiglitz, deslocou-se «encantado» ao Parque do Retiro para levar a cabo uma análise da situação actual.
Com um megafone e um tradutor improvisado, o prémio Nobel passou revista à situação política actual, atribuindo os problemas da crise económica à escassa regulação dos mercados. «Os mercados pouco regulados foram uma experiência que durou três décadas e agora são os governos que têm de responder.»
A sua primeira intervenção arrancou os aplausos dos acampados, que mostraram a sua aprovação com o código assembleário, levantando as mãos em forma de agradecimento e rodando os pulsos.
O autor de O Mal-estar da Globalização considera que a bola se encontra no campo dos governos, e que são eles quem deve responder a uma série de necessidades que, de momento, não estão suprir. Entre elas, destacam-se a pobreza ou a má utilização dos recursos laborais, dois aspectos que para o prémio Nobel da Economia resultam num paradoxo: que haja «gente sem tecto e, por outro lado, haja espaços que não estão a ser utilizados.»
Joseph Stiglitz mostrou-se solidário com as centenas de presentes que escutaram atentamente as suas palavras. «No meu país não estamos tão mal como em Espanha», acrescentou. A solidariedade é na sua opinião o pilar no qual a Europa se deve sustentar para solucionar a crise. Neste sentido, considera que foi dado um grande passo na quinta-feira passada em Bruxelas.
Impressionado com a «energia do movimento», Stiglitz agradeceu ao 15-M o seu esforço. «Toca-me no coração», declara, terminando com um incentivo aos presentes para «trocarem as más ideias por boas ideias» através da organização, do debate público e de liderança.
«Será um processo difícil porque temos estado envoltos noutras ideias nos últimos trinta anos. O movimento representa uma oportunidade de unir as ciências económicas ao Estado Social e à solidariedade», conclui. Os indignados voltam a aplaudir, e desta vez quebram o protocolo e o silêncio respeitoso dá lugar a uma estrondosa ovação.


Tradução de Francisco Venes

segunda-feira, 25 de julho de 2011

O que se Está a passar na Somália não é Um Desastre Natural

Adam Ramsay | Bright Green

Nos mês passado, perguntei a uma agricultora queniana qual o impacto na comunidade da especulação nos alimentos. «A comida está a tornar-se cada vez mais cara», disse-me. Falou-me igualmente sobre como as alterações climáticas estavam a atingir a sua comunidade, de como se estava a tornar cada vez mais difícil plantar produtos agrícolas.
É demasiado fácil olhar para imagens de bebés subnutridos e acreditar tratar-se de algum tipo de desastre natural. É fácil, porque a alternativa é aceitar uma verdade dolorosa — existem pessoas a fazer isto aos somalis. São eles banqueiros que jogam com o preço dos alimentos, gestores petrolíferos que fecham os olhos relativamente aos impactos das alterações climáticas, grupos de pressão corporativos que insistem para que o FMI e o Banco Mundial forcem a abertura dos mercados dos países africanos. São pessoas que dizem coisas como «o capitalismo é o único sistema que funciona» quando isso significa que é o sistema que actualmente funciona para eles. Vivem em cidades como Londres ou Nova Iorque, e são normalmente bastante amigáveis.
É mais fácil olhar para a situação como um desastre natural mas, não existe nada de natural acerca disto. É certo que existe uma seca. E sim, esta terá diminuído a produtividade. Mas alguns países são capazes de lidar com secas. O motivo para que esta seca tenha levado à fome deve-se a uma concepção humana: a pobreza.
E mesmo a própria seca não tem nada de natural. É certo que não se pode dizer que cada evento meteorológico é resultado de alterações climáticas. Mas pode-se dizer que a sua intensidade o é. Pode-se dizer que a sua frequência o é. E, tal como Financial Times descreve:

«As secas costumavam ocorrer na região tipicamente a cada 10-15 anos mas tornaram-se mais regulares, afectando os mecanismos de reacção das comunidades sujeitas a viver num ambiente frágil e semidesértico.»

Podemos portanto afirmar o seguinte: sem o nível de carbono que bombeámos para a atmosfera, não teríamos nem a frequência nem a escala de secas a que hoje assistimos. As comunidades teriam tempo para recuperar e e ganhar resiliência. As alterações climáticas são portanto responsáveis por uma parte significativa do sofrimento. E, por isso, também o é o nosso sistema económico de exploração intensiva dos recursos e aqueles que exigem que o mantenhamos. Em particular, quando os gestores petrolíferos agem de forma a prevenir acções relativas às alterações climáticas, temos de perceber que eles estão a causar essas mortes.
Mas a seca é apenas um factor. Chegou no meio de uma tempestade perfeita para a Somália, com preços dos alimentos a nível global muito elevados e um governo muito fraco.
Os factores que estão a impulsionar a subida dos preços dos alimentos são numerosos: uma série de eventos meteorológicos por todo o mundo, ligados a alterações climáticas, uma utilização crescente de terrenos agrícolas para biocombustíveis e produção de forragem para animais. Mas a especulação à volta destas subidas é crucial. Assim que os banqueiros, que destruíram a nossa economia, se aperceberam de que não podiam continuar a depender das hipotecas subprime — cobrando valores que forçaram as pessoas a deixar as suas casas —, passaram para algo diferente: jogar nos mercados de matérias-primas, forçando preços que retiram a comida da mesa das pessoas. Os preços subiram de forma rápida. É com este custo que a agricultora queniana com que falei se preocupava há um mês atrás. É este custo que se encontra escrito na cara dos somalis que fogem à fome. Não é um fenómeno natural. É impulsionado pelos banqueiros que causaram a crise do crédito para que possam continuar a fazer os seus milhões. Grupos políticos e ONGs deixaram bem claro que os seus esquemas financeiros arriscavam-se a matar milhares. Estes recusaram-se a parar.
Mas, como é óbvio, o assunto é mais complexo do que isso. A política somali é um exemplo de má organização há já algum tempo. Bem, na verdade é mais complexo do que isso também. Não existe apenas uma política somali. Aquilo de que estamos verdadeiramente a falar é, mais propriamente, de três países. Cada um tem o seu governo, ou falta dele, e cada um com os seus sucessos e falhas. Mais especificamente, tal como eu o percebo, a Somalilândia e a Puntlândia são governadas com relativo sucesso. A metade Sul do país, maioritariamente dirigida (ou, mais precisamente, talvez não dirigida) a partir de Mogadíscio, é a área com os problemas mais sérios. E, por isso, não é surpreendente que seja ali que a fome ataque.
Mas se olharmos para o Sul, que está efectivamente sem um governo desde 1991, é importante perceber o porquê disto. A guerra civil que devastou o país começou após 10 anos de de programas de reajustamento desastrosos por parte do FMI, que viram o PIB per capita cair a uma taxa de 1,7% ao ano desde a sua introdução. Este programa consistia largamente em cortes (milhares de funcionários públicos foram demitidos), privatizações e desregulamentação — os três cavaleiros do Apocalipse neoliberal a que nos temos habituado. Claro que a guerra é mais complexa que isto. Mas devemos aceitar que o colapso económico torna a violência mais provável e que a imposição ocidental de políticas de capitalismo corporativo tiveram o seu impacto.
Quando vemos somalis a morrer, é muito simples pensar num desastre natural. Mas os preços dos alimentos são elevados porque os banqueiros — muitos neste país — estão a jogar com eles. As secas são mais frequentes graças a gestores petrolíferos que reclamam o direito de continuar a explorar e extrair e a manter a nossa sociedade dependente de combustíveis fósseis. O caos no Sul do país é um resultado de um acumular da história — um resultado, entre outras coisas, do colonialismo britânico, italiano e soviético e dos condicionalismos do FMI, pensados para as corporações ocidentais e não para o povo somali. Estas políticas corporativas de mercado, estes destruidores climáticos e estes banqueiros e especuladores estão a afectar pessoas no Reino Unido à medida que sentimos o peso da austeridade. No Ocidente, as pessoas começam a perceber quem é responsável por arruinar tantas vidas. Deveríamos igualmente perceber que estas mesmas pessoas não estão apenas a arruinar a vida daqueles que vivem no Corno de África. Estão a matá-las aos milhares.

Tradução de Francisco Venes

quarta-feira, 13 de julho de 2011

A retórica dos interesses


Como é maleável a retórica dos interesses dominantes. A tese de que os gastos públicos consomem recursos do sector privado que, se libertados, provocarão uma libertação das forças vivas da produção e crescimento económico era ainda há pouco tempo enunciado como verdade evidente por vastos sectores da direita política, apoiando-se na respeitável retórica da direita académica. Setenta anos depois da Grande Depressão, a generalidade da macroeconomia neoclássica tem mantido a lei de Say ligada ao ventilador, desencantando formas rebuscadas de continuar a alegar que toda a oferta gera a sua própria procura, que não há desemprego involuntário, que o conceito de procura agregada não tem fundamento e que a intervenção expansionista do estado é sempre contra-producente e iníqua. Do monetarismo dos anos 70 para a teoria dos ciclos económicos reais dos anos 80 em diante, houve até um retrocesso em termos de realismo, passando a rejeitar-se a mera possibilidade da política monetária (a orçamental fora já discartada) influir no nível de actividade económica e a alegar-se que todas as expansões e contracções são causadas por factores reais (novas tecnologias, chuvas intensas e outras coisas caídas do céu). Toda esta retórica dá imenso jeito em fases de relativa expansão de modo a defender a redução do papel expansivo e estabilizador do estado, não vá a proximidade do pleno emprego ter como consequência que os trabalhadores, menos pressionados pela realidade ou iminência do desemprego, comecem a alcançar direitos e aumentos salariais excessivos e a ter outras ideias mais ousadas. Já quando, como no contexto europeu e norte-americano actual, começa a tornar-se evidente que a procura tem de vir de algum lado e que a austeridade pública é mesmo recessiva, mas se pode argumentar que “tem que ser, pois a dívida é insustentável eo problema tem que ser resolvido assim”, a direita (em Portugal como nos EUA e noutros lados) esquece convenientemente a preocupação com a teoria económica e os convictos anúncios da morte de Keynes. Dispõe de uma retórica igualmente fictícia, mas mais eficaz.

(publicado simultaneamente nos Ladrões de Bicicletas)

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Uma associação para contrariar hegemonias

World Economics Association: Novidades

A fundação da WEA foi um sucesso retumbante, já que 3500 membros, de 110 países, fizeram a sua inscrição, em apenas uma semana (ver press release aqui). Actualmente, a WEA tem 4800 membros em mais de 120 países. 
 
Leia um artigo sobre o ataque aos grupos estabelecidos (Assault on the Establishment), por Olaf Storbeck, publicado no Real-World Economics Review Blog aqui.
 
O lançamento da WEA está a entrar na sua segunda fase. Estamos a pedir a vossa ajuda para espalhar a palavra, através da mailing list e website da vossa organização. Aqui estão alguns dados básicos:

Tornar-se membro da WEA é gratuito e rápido. Para se inscrever, vá a http://worldeconomicsassociation.org/index.php e insira o seu nome, país e endereço de email.

A WEA aceita e acolhe, como membros, não-economistas interessadas e interessados em economia e na sua relação com o seu campo disciplinar.

Aqui está o Manifesto da WEA.
Aqui está a lista dos Membros Fundadores.

A WEA publicará, inicialmente, três revistas trimestrais online e organizará conferências online. As subscrições online são gratuitas para os membros (será cobrada uma verba por cópias físicas). O número estimado de membros da WEA significa que as suas revistas terão uma das maiores audiências do mundo. Estas revistas e corpos editoriais estão disponíveis no website.

A WEA está registada como Community Interest Company no Reino Unido, uma instituição sem fins lucrativos. Não tem grandes doadores institucionais ou privados. Ao invés disso, garante o seu apoio através de pequenas doações dos seus membros.

Esperamos que divulgue alguma desta informação através das suas redes. Toda a ajuda que nos puder dar será apreciada por muita gente. 

Cumprimentos,

Edward Fullbrook
Fundador WEA


(tradução nossa)

terça-feira, 5 de julho de 2011

GOLDEN SHARE OU HIPOCRISIA DOURADA?


A Comissão Executiva da PT – que impôs que os salários dos trabalhadores da empresa em 2010 não tivessem aumentos superiores a 0,8% ou 1% - foi nesse mesmo ano remunerada com mais de 6,4 milhões de euros. E os dois membros da Comissão Executiva que cessaram entretanto funções (Rui Pedro Soares e Fernando Soares Carneiro) receberam um total de 1,8 milhões de euros de “compensação”!

Por seu turno, a PT foi adquirindo a VIVO do Brasil entre 1998 e 2003 e pôde inscrever nas suas contas os valores envolvidos nessas aquisições como “prejuízos”, obtendo assim um benefício fiscal calculado entre 750 e 1000 milhões de euros.

Assim que a mesma VIVO começou a dar lucros, a PT logo criou uma empresa na Holanda (a PT-BV) onde passaram a ser colocados esses lucros, não pagando assim quaisquer impostos em Portugal.

Em 2010, como se sabe, a PT vendeu a VIVO por 7,5 mil milhões de euros, dos quais já recebeu 5,5 mil milhões, sendo que sobre as mais-valias deste modo obtidas não pagou 1 cêntimo de impostos!

Por isso, enquanto em 2009 a PT teve 684 milhões de euros de resultados líquidos e pagou 175 milhões de euros de impostos, em 2010 teve 5,672 milhões de euros de resultados líquidos e pagou de impostos… apenas 110 milhões de euros!?

Em 2011, a PT vai distribuir 1,30€ de dividendos por cada acção, representando essa distribuição que 130 milhões de euros dos mesmos dividendos não pagarão qualquer imposto. E isto porquê? Porque o regime fiscal foi alterado para 2011 de modo a que, a partir deste ano as SGPS e os Fundos de Investimento – que até aí estavam totalmente isentos de pagamento de impostos – só o estejam se detiverem 10% do capital social da empresa que distribui ganhos. Então o BES, que detinha no início de Dezembro de 2010 7.9% do capital social da PT, utilizou os lucros (cerca de 210 milhões de euros) que, em antecipação para fugir à tributação, recebeu nessa mesma altura para aumentar para 10,03% a sua participação social na mesma PT. E assim tudo o que receber de lucros em 2011 continuará a estar isento de qualquer pagamento de impostos…

Tudo isto começou nos anos de Governação PSD e culminou com o Governo Sócrates, sempre dispondo o Estado de uma golden share na PT. O que mostra que não basta que o Estado detenha ou controle este tipo de empresas estratégicas mas é ainda imprescindível que a política que o Governo executa seja uma política correcta e ao serviço dos interesses do Povo Português e não do grande capital financeiro.

O agora anunciado fim desse tipo de golden shares na PT, na REN e na EDP não é uma novidade pois já constava do acordo com a troika subscrito pelo PS, PSD e CDS mas significa, por um lado, privar o País do controle sobre empresas de sectores absolutamente fundamentais e estratégicos, não apenas do ponto de vista económico mas também da perspectiva da própria soberania e independência nacionais; e, por outro lado, facilitar o caminho para as privatizações que aquele acordo impõe e que representarão a venda dos principais activos do País, ainda por cima a preço de saldo, e que conduzirão ao drástico empobrecimento do Povo Português durante duas a quatro décadas.

Por fim, é de sublinhar a completa hipocrisia dum dirigente do PS (Francisco Assis) que teve o descaramento de vir dizer que “via com preocupação” o fim das golden shares, quando foi o mesmo PS que o aprovou ao assinar o acordo com a troica!

E é esta gente e quem a apoia, defende e representa, que vem todos os dias para as televisões, rádios e jornais proclamar que os trabalhadores portugueses têm “vivido acima das suas possibilidades”, que devem pagar a dívida, que devem aceitar ver os seus salários, as suas pensões e os seus benefícios sociais congelados ou mesmo diminuídos e que devem ter os seus impostos aumentados, que não se deve elevar o salário mínimo nacional e que, se não aceitarem tudo isso docilmente, devem poder ser fácil e quase gratuitamente despedidos!!??


António Garcia Pereira
(Texto também publicado em: http://bloggarciapereira.blogspot.com/)

Éric Toussaint: «Portugal deve repudiar de forma soberana a parte ilegítima da dívida»


Éric Toussaint, presidente do Comité para a Anulação da Dívida do Terceiro Mundo, esteve em Lisboa, a convite do CES, para explicar o que é uma auditoria à dívida.
Éric Toussaint sabe o que é uma auditoria à dívida - ao serviço do novo governo de esquerda do Equador, Toussaint fez parte da equipa que investigou a origem e o destino da dívida pública do país, um processo que levou ao julgamento de responsáveis políticos e à decisão unilateral de não pagar parte da dívida equatoriana. As situações da América Latina e da Europa são diferentes, mas há lições comuns a tirar, explica Toussaint.

O que é a auditoria à dívida? Como funciona?
É um instrumento para analisar de maneira rigorosa as características da dívida pública interna e externa. Isto significa analisar as cláusulas dos contratos e a utilização dos fundos, e emitir uma opinião. Não é só analisar do ponto de vista do direito comercial, para ver se um contrato é ilegal. A auditoria tem de ser integral, isto é, tem de apurar como foi utilizado o dinheiro, qual foi o impacto ao nível dos direitos económicos e sociais, ao nível ambiental. A auditoria é um instrumento para identificar dívidas legítimas e ilegítimas.

O que são dívidas legítimas e ilegítimas? Como traça essa diferença?
As dívidas ilegítimas podem ser dívidas ilegais [que partam, por exemplo, de actos de corrupção]. Mas mesmo as que são legais podem ao mesmo tempo ser ilegítimas.

Dê-nos um exemplo.
Um exemplo muito concreto: os empréstimos do FMI, do Banco Central Europeu e dos governos europeus à Grécia, à Irlanda e agora a Portugal. São créditos outorgados sob condições que implicam a violação de direitos económicos e sociais da população do país, em contradição com convenções assinadas pelo país com instituições como a Organização Internacional do Trabalho, etc. Ou sobre os princípios de contratação colectiva que foram postos em questão por tal condicionalidade. Para mim estes créditos são dívida do tipo ilegítimo. Além disso, ocorreram num contexto de chantagem dos mercados financeiros e o país não tem alternativa a não ser aceitar as condições da troika. As duas partes do contrato têm de ter total autonomia de vontade e neste caso penso que o governo português não tem essa autonomia porque está sob uma pressão tremenda dos credores.

Mas olhar para este empréstimo não é ver o processo já na sua fase terminal? Não há toda uma dívida acumulada para trás? Como é que se audita essa dívida?
Há que determinar a partir de que ano se começa a auditoria. Eu participei na auditoria oficial da dívida do Equador e o nosso mandato era auditar a dívida entre 1976 e 2006. Trinta anos de endividamento. Há que analisar os créditos comerciais, os créditos com os organismos multilaterais, os créditos bilaterais.

Como se audita o uso dessas verbas pedidas? Já este ano é difícil saber exactamente como gastámos todo o dinheiro em 2010 - como consegue auditar o que foi pago em 1985?
Depende de quem organiza a auditoria. No caso do Equador [auditoria concluída em 2008] foi por iniciativa do novo governo depois de cinco anos de campanha a favor da auditoria por parte de movimentos sociais. Essa decisão abriu-nos as portas e os arquivos do ministério das Finanças e do banco central, mesmo com a resistência de altos funcionários do ministério e do banco central. No caso de Portugal não se fala em auditoria. A questão aqui é saber se a sociedade civil e os movimentos de cidadãos querem começar uma auditoria de cidadãos, sem apoio do governo. Há que saber se no Parlamento há uma maioria parlamentar disposta a constituir uma comissão parlamentar de auditoria. E há mais dois poderes: o executivo (o governo) e poder judicial. Podia ser o público a pedir ao poder judicial que investigue.

É essa a principal novidade, o facto de esta ser uma auditoria pedida pelas pessoas?
O novo no tema da auditoria é isto: até há alguns anos a auditoria era um instrumento apenas nas mãos do Tribunal de Contas e de empresas privadas de auditoria. Essas famosas agências de notação de risco têm de fazer auditoria. Conhecemos firmas internacionais como a KPMG, a Delloitte, a PriceWaterhouseCoopers, etc. O novo é que agora os movimentos sociais exigem uma auditoria. E essa iniciativa começou antes dessas explosões recentes em Espanha e na Grécia, com os indignados. Esse poderoso movimento - que é muito fraco em Portugal, mas muito forte em Espanha e na Grécia - está ligado a essa vontade de uma parte da sociedade civil, que se sente mal representada, querer controlo e capacidade de influir sobre a vida política.

Não lhe parece que estamos muito longe disso em Portugal?
Pode ser. Mas ao mesmo tempo estamos a viver uma aceleração da história europeia devido à crise. E coisas que eram inimagináveis num momento podem transformar-se até em obrigatórias. Vim aqui convidado por organismos portugueses que querem aprender com outras experiências e saber se são executáveis em Portugal.

Por que é que os cidadãos não se preocuparam nos últimos anos com isso e só agora surge esta preocupação?
A situação muda quando há uma crise. Há cinco anos os governos europeus diziam que tudo andava perfeitamente. Até falavam de margem para aumentar gastos. A cidadania, influenciada por esse discurso oficial, pensava que tudo estava sob controlo. Tudo começou a mudar com a crise que explodiu nos EUA em 2007 e o contágio à Europa em 2008. Há uma mudança total de panorama e o público agora dá-se conta que o mundo está dirigido por poderes que não são eficientes, que não são controlados, que estão sob a pressão de forças como os chamados "mercados financeiros", que aparecem como um ente misterioso.

Mas o problema não está precisamente no facto desses países hoje afectados se terem colocado nessa posição acumulando enorme dívida? Culpar os credores não o mais fácil? Não há uma responsabilidade partilhada? Das suas palavras sou levado a concluir que só os credores são os maus da fita.
De acordo, há uma responsabilidade partilhada e por isso eu digo que se há evidência de uma política de endividamento exagerado e ilícito há que acusar judicialmente os responsáveis. No caso do Equador foram acusados antigos ministros das Finanças. Há um antigo ministro [ver nome] que foi sentenciado com 5 anos de cadeia e está em fuga nos EUA, que não o querem extraditar ao Equador.

O que tinha feito esse ministro?
Assinou contratos - juntamente com outros altos funcionários que também foram acusados - prejudicando os interesses da nação e desrespeitando a lei do Equador. Não é um juízo político a um governo anterior de outra linha política. É uma violação da lei, ligada a enriquecimento pessoal. Quando se negoceiam empréstimos os credores podem propor subornos ou o ministro pode sugerir uma comissão.

Seria possível em Portugal, no domínio da teoria, chegar à conclusão que ministros do passado pudessem ser acusados de crime público e julgado?
Para mim é imaginável. Não vou afirmar que é provável. Claro que a auditoria não chega a uma sentença. A auditoria dá os dados e uma interpretação. O poder judicial, executivo e legislativo é que têm de tomar decisões.

Imaginando que Portugal faz uma auditoria do tipo que defende. O que faríamos depois com os resultados?
Repudiar de maneira soberana a parte ilegítima da dívida. Tomar um acto soberano que claro que põe em causa as regras actuais na zona euro, mas que não implica sair da União Europeia. Implica tomar medidas unilaterais justificadas, compreensíveis pela opinião pública, para dar outra saída para a crise. Um tema fundamental da minha intervenção é a possibilidade de um acto soberano unilateral baseado em argumentos com fundamentos jurídicos internacionais e justificados com a busca da justiça social. Não é um acto unilateral para prejudicar a comunidade internacional, nem um acto que não toma em conta o direito internacional. Por isso fazemos um trabalho com a CADTM (Comité para a Anulação da Dívida do Terceiro Mundo) para definir argumentos jurídicos para actos soberanos de repúdio de dívida ilegítima.

domingo, 3 de julho de 2011

Eric Toussaint :: O Que Fazer com Esta Dívida?

Éric Toussaint é historiador e politólogo, presidente do Comité para a Anulação da Dívida do Terceiro Mundo (CATDM), membro do conselho científico da Attac França, da rede científica da Attac Bélgica e do conselho internacional do Fórum Social Mundial. Participou no Comité de Auditoria nomeado pelo Presidente do Equador Rafael Correia e acompanhou a par e passo a experiência de reestruturação desse país.









sexta-feira, 1 de julho de 2011

Os últimos minutos na cabeça de mr. coelho antes de anunciar o corte no natal

(esta que vos fala teve acesso privilegiado à cabeça do sr. primeiro e levou gravador. segue a transcrição. peço perdão pela linguagem sexista e pelo pensamento confuso, mas uma transcrição é uma transcrição e a cabeça do senhor é mesmo assim)


podia fazer disto uma campanha publicitária: "50% do natal foi à vida, esqueçam as compras, comprem a (dí)vida. O PSD na luta contra o consumismo!" hmmmm... nops, muito à esquerda... e volta a ensaiar no espelho, lembra-se do seu companheiro anterior "assim fica melhor ou fica melhor assim?". não quero usar a cena da pesada herança, tinha dito que não ia - carai a rico não devas, a pobre não prometas... não interessa. então assim: "portugueses: sabem que eu gosto de falar simples: já não há prata na casa, o guterres vendeu as jóias da avozinha - que deus a tenha! - o cavaco empenhou os lenços de seda da tia em betão, e muito bem aliás, o durão só vendeu mesmo os botões de punho, mas teve de ser - nas guerras é que se vê o futuro dos grandes homens e as idas para cargos europeus são caríssimas - e o sócrates vendeu tudo o que não era possível privatizar e privatizou tudo o que valia a pena vender. não ficou quase nada. quase nada. o que falta privatizarei eu, mas baratinho que é para não assustar os mercados. estamos de pantanas e eu só agora percebi. nada mais há a fazer e tanto isto me custa, queridos cidadãos, mas é melhor assim para não ser pior. imaginem que era o salário inteiro? imaginem a grécia? imaginem o que eu ia dizer à nossa querida merkel? (tão bem as fotografias, tão bem, o meu à vontade... ai!!!!... nasci para isto). imaginem que vos pedia para começarem a pagar para respirar? para irem trabalhar de graça como os pobres e os desempregados? estão a ver? podia ser muito pior. pode ser sempre pior. é importante aceitarmos isso, é uma lei da vida."

e se me perguntarem por aquelas ideias doidivanas da esquerda? impostos sobre as grandes fortunas, auditoria e reestruturação da dívida, investir no sector produtivo... credo! mas onde é que esta gente vive... já não há sector produtivo à séculos, toda a gente sabe que o vendemos à UE ... e vê-se mesmo que não foram à reunião com o FMI, senão tinham já visto bem como é que era. a culpa é deles aliás, toda a gente sabe, naquela altura que estiveram no governo com o soares... peraí... eles nunca chegaram a ser governo, pois não? não interessa. a culpa é deles na mesma. deles e da crise internacional. anarcas! - são todos anarcas não são?... um dia destes tenho de fazer um curso rápido de correntes da esquerda a ver se amando uma frasezinha inteligente na assembleia ao irritante do louçã com aquele ar académico - avante! (cruz credo!) adiante!

estou pronto. frase final: metade do natal. e será que precisamos mesmo do natal inteiro? é fácil, como diz o saraiva, e muito bem aliás, em vez do bacalhau, comam só perú. onde é que está o parágrafo do acordo com o FMI onde isso está escrito????... não encontro... deixa ver... perú.... não encontro... não faz mal. não posso é esquecer-me de avisar os bancos que o empréstimo de 15 mil milhões tá garantido e de dizer à laura que este ano faça bacalhau com natas que eu odeio o bacalhau com grão. o perú pode fazer igual.

(e foi isto. sorry. nada mais)

PS: Isto é verdade, não é brincadeirinha do 1º de Abril, que eu sou pessoa séria. 

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