Declaração da Conferência de Atenas sobre Dívida e Austeridade
Declaração de Ação e Solidariedade | Maio 2011
Nós, representantes de movimentos e ativistas de todo o mundo, reunimo-nos em Atenas para discutir as lições das anteriores crises económicas internacionais, para oferecer a nossa solidariedade ao povos europeus que lutam contra programas de austeridade impostos por governos da União Europeia, e para formular um plano de ação para uma economia que responda às necessidades do povo e não de uma pequena elite social.
Muitos países no mundo desenvolvido vivem em crises de dívida desde os anos 70. Após empréstimos irresponsáveis feitos pela finança internacional, alguns dos povos mais pobres do mundo depararam-se com cortes nos rendimentos e nas prestações sociais quando o Fundo Monetário Internacional impôs políticas severas como contrapartida pelas ajudas à finança e aos bancos.
Estas políticas foram injustas e não ajudaram à recuperação. Em vez disso, aumentaram a dependência dos países endividados face ao poder dos mercados financeiros, tornando os governos menos responsabilizáveis perante o seu próprio povo. Só quando um conjunto de países se levantou contra a imposição da austeridade, contra a ajuda à finança e contra o peso insustentável da dívida foi possível recuperar economicamente. Foi isto o que sucedeu na Argentina em 2001.
Hoje, os países periféricos da União Europeia enfrentam uma profunda crise da dívida. Foram empurrados para ela por um quadro institucional injusto da União Europeia e das suas políticas económicas neoliberais, assim como pelo sistema financeiro internacional, que se tornou extremamente poderoso, predatório e irresponsável.
No despertar da crise económica internacional, dívidas maciças foram contraídas pelos países periféricos, refletindo por um lado o fosso face ao centro da eurozona, e por outro aprofundando a desigualdade entre os mais ricos e o resto da sociedade. Os trabalhadores trabalhadoras são agora forçados a carregar o peso destas dívidas, mesmo sabendo que não beneficiaram com ela.
Medidas de austeridade e a privatização irão pressionar mais duramente os mais pobres, enquanto aqueles que criaram a crise serão ajudados. Os ricos e as grandes empresas continuarão a escapar a impostos que poderiam ser utilizados para construir uma sociedade mais justa. Se essas medidas não forem contestadas, terão um imenso impacto na Europa, alterando, por longos anos, o equilíbrio de poderes a favor do capital e contra o trabalho.
Aqueles que estão na primeira linha opor-se-ão à tentativa de transferir para os pobres e para quem trabalha os custos da crise, enquanto os muito ricos escapam. Em primeira instância, isto quer dizer que os povos da Grécia, da Irlanda e de Portugal desafiarão as políticas de austeridade da União Europeia e do FMI, opondo-se ao poder financeiro internacional e rejeitando a escravatura da dívida. Apelamos aos povos de todo o mundo para que manifestem a sua solidariedade para com os movimentos que nestes países lutam contra a dívida e contra as políticas nocivas que lhe sucedem.
Pedimos especificamente apoio para:
* A auditoria democrática das dívidas como um passo concreto na direção da justiça do endividamento. Auditorias da dívida que envolvam a sociedade civil e os movimentos de trabalhadores organizados permitirão definir que partes da dívida pública são ilegais, ilegítimas, odiosas ou simplesmente insustentáveis. São um instrumento que permite a quem trabalha verificar a validade da dívida pelo qual está a ser responsabilizado e exercer o controlo sobre o reembolso. Incentivam igualmente a responsabilidade democrática e a transparência na administração do setor público. Manifestamos solidariedade com a auditoria da dívida na Grécia e na Irlanda e estamos prontos para ajudar em termos práticos.
* Respostas soberanas e democráticas à crise da dívida. Os governos devem responder primeiramente ao seu povo, e não a instituições às quais não pode pedir responsabilidades, como a União Europeia ou o FMI. Os povos de países como a Grécia devem decidir que políticas aumentam as suas hipóteses de recuperação e de sustentabilidade. Há muitas de experiências de respostas soberanas efetivas e radicais ao problema da dívida.
Os Estados soberanos detêm o poder de impor uma moratória ao pagamento se a dívida estiver a destruir a subsistência dos trabalhadores e trabalhadoras. Mesmo as resoluções da ONU legitimam a cessação dos pagamentos em estado de emergência.
* Reestruturação económica e redistribuição, não endividamento. O domínio das políticas neoliberais e o poder da finança internacional levaram a um baixo crescimento, ao aumento das desigualdades, a grandes crises e à erosão dos processos democráticos.
É imperativo que as economias sejam colocadas em bases diferentes através de programas de transição, que incluem o controlo de capitais, o controlo sobre os bancos e a sua apropriação pública, uma política industrial que assente no investimento público e respeite o meio ambiente. O primeiro objetivo deverá ser proteger e ampliar o emprego. É igualmente vital que os países adotem políticas redistributivas de grande amplitude.
A base tributável deverá ser mais ampla e mais progressiva, através da tributação do capital e dos ricos, permitindo assim a mobilização dos recursos internos como alternativa à dívida. A redistribuição deverá igualmente incluir a restauração dos serviços públicos de saúde, educação, transporte e pensões, assim como reverter a pressão para diminuir salários e vencimentos.
Estes são os primeiros passos para a criação de uma economia que responda às necessidades e aspirações dos povos, alterando o equilíbrio de poderes em detrimento do grande capital e das instituições financeiras.
E permitirão que os povos de toda a Europa, e mais amplamente de todo o mundo, exerçam um melhor controlo sobre suas próprias vidas, e sobre o processo político. Oferecerão igualmente esperança à juventude de toda a Europa, que que se vê atualmente diante de um futuro sombrio, de emprego escasso, salários baixos e falta de perspetivas. Por estes motivos, a justiça face ao problema da dívida da Grécia, Irlanda e Portugal é do interesse dos trabalhadores de todo o mundo.
Atenas, 8 de Maio de 2011
Initiative for the Greek Audit Commission
European Network on Debt and Development
The Committee for the Abolition of Third World Debt (CADTM)
The Bretton Woods Project, UK
Research on Money and Finance, UK
Debt and Development Coalition Ireland
Afri - Action from Ireland
WEED - World Economy Environment Development, Germany
Jubilee Debt Campaign, UK
Observatorio de la Deuda en la Globalización, Spain
"Os Estados soberanos detêm o poder de impor uma moratória ao pagamento se a dívida estiver a destruir a subsistência dos trabalhadores e trabalhadoras. Mesmo as resoluções da ONU legitimam a cessação dos pagamentos em estado de emergência."
ResponderExcluirPor acaso, tem mais informações sobre esta afirmativa?