quarta-feira, 6 de abril de 2011

Obviamente, há alternativa. Ao contrário do que afirma o dominante, ultra-liberal, pensamento único.

"(...) A redução da despesa em períodos de desemprego elevado é um erro. Os defensores da austeridade prevêem que esta produza dividendos rápidos sob a forma de aumento da confiança económica, com poucos ou nenhuns efeitos negativos sobre o crescimento e o emprego; o problema é que não têm razão. Cortar na despesa numa economia em recessão acaba por ser contraproducente nem que seja em termos fiscais: quaisquer poupanças na despesa são anuladas pela redução da receita fiscal resultante da contracção da economia. É por isso que a estratégia correcta é emprego primeiro e défice depois (...)”

Toda a gente pode compreender com facilidade esta simples evidência económica. Excepto se for banqueiro e estiver a engordar com juros agiotas cobrados ao Estado. Ou se estiver interessado em surfar a crise para desmantelar o estado providência, privatizar serviços públicos e atacar direitos do trabalho.

7 comentários:

  1. Já fez um juízo de valor sobre quem discorda dessa "evidência económica". É com certeza porque já está definitivamente esclarecido sobre o assunto.
    Se pensa que pode ainda reflectir um pouco mais sobre o assunto, sugiro-lhe um tema de reflexão: opte pelo déficit, tudo bem, mas com que diinheiro é que o paga?
    Se quiser, pode-me considerar banqueiro agiota, ou surfista exterminador do Estado providência. Seria uma asneira, mas esteja à vontade para o fazer.
    Ah! E se tiver uma resposta para a questão que coloquei diga-ma por favor, que eu preferia acreditar nessa "evidência económica" a pensar que para recuperar o crescimento vamos ter de fazer um ajustamento violento e doloroso que vai, entre outras coisas, passar por reduções muito substanciais nos salários e no nível de vida de todos os Portugueses.

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  2. Caro Manuel Pires,

    Tenho muito que aprender acerca de tudo e não estou definitivamente esclarecido acerca de rigorasamente nada. Mas não sou adepto da política 'não há alternativas'. Deixo-lhe um paper com algumas: http://varoufakis.files.wordpress.com/2010/11/ceb1-modest-proposal-2-1-light-version-excluding-context-and-rationale.pdf

    Como imagina, há mais. Se utilizar num par de horas a surfar na net, quem sabe, consegue encontrar algumas que estejam de acordo com a sua visão do mundo.

    Agradeço o seu comentário, cumprimentos,
    Paulo Coimbra

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  3. Caro Paulo,
    Agradeço a sua resposta.
    Não vou analizar detalhadamente os pormenores técnicos do "paper", nomeadamente para verificar se as contas fecham. Mas faço-lhe (ao paper) desde já um reparo: como muitas das soluções que a esquerda tem preconizado para a crise, depende exclusivamente daquilo que outros (a UE, o BCE, o BEI) podem fazer por nós, e não daquilo que nós podemos fazer por nós. Ou seja, está condenado à partida se estes terceiros nao for tão caridosos ou solidários como os pressupostos exigiriam. E não são.
    Se eu fosse de esquerda, e não sou, e pretendesse que os sacrifícios do violento ajustamento que inevitavelmente nos vai atingir não caíssem mais uma vez exclusivamente sobre as vítimas do costume (desempregados, reformados, assalariados até à classe média), e pretendo, sairia do estado de negação relativamente à inevitabilidade do ajustamento e do seu impacte sobre estes que enumerei, e faria os possíveis por não deixar escapar aos sacrifícios os outros, através de propostas que contribuissem para os objectivos do ajustamento, acelerando-o na medida do possível, e assegurando que todos contrubuiriam para ele.
    E colaborando no processo "austeritário" em vez de ficar de lado e se esforçar por lhe arranjar nomes com conotações negativas, acredito que houvesse muito que a esquerda pudesse fazer neste domínio. Pondo-se de lado, vai ter excelentes oportunidades de fazer críticas contundentes, mas a pancada, para quem leva, vai ser bem maior.
    Cumprimentos,

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  4. Caro Manuel Pires,

    Parece-me que está a confundir o legítimo direito que os países têm de discutir os termos da sua integração política na Europa com uma suposta mendicância de que alegada e cronicamente padece uma parte das alternativas de esquerda. Enfim, todos percebemos que alguma picardia pode animar as discussões e ninguém se ofende.

    Na minha visão das coisas, defendendo a ideia de uma Europa politicamente unida, o processo que tem sustentado a (necessária) integração política tem sido conduzido de modo insuficientemente democrático. Conseqentemente, o que temos hoje na Europa é um quadro político, legal e económico que beneficia os países mais competitivos do centro impedindo a convergência absolutamente necessária à existência de uma moeda única ou mesmo de um projecto político comum.

    Se me parece certo que Portugal e os países da periferia podiam ter feito mais e melhor, também sou da opinião que o processo de construção do mercado interno europeu e da moeda única ( que defendo) explica em boa medida a divergência económica que actualmente assola a Europa.

    Como se tornou evidente, dada a heterogeneidade do espaço económico europeu, as economias dos países do centro e da periferia carecem de diferentes políticas. A meu ver, as necessárias escolhas têm sido impostas pelo centro aos restantes. Um euro extremamente valorizado prejudica as economias menos competitivas. Um banco central independente do poder político e exclusivamente mandatado para objectivos de inflação, mimetiza o Bundesbank, serve a Alemanha mas não serve Portugal. A proibição do financiamento directo do BCE aos Estados, impondo a intermediação da banca privada, carece de fundamento económico. O mesmo pode dizer-se acerca dos critérios de convergência nominal. A esta circunstância acresce que não se conhecem experiências bem sucedidas de integração monetária não suportadas por um significativo orçamento comum.

    Enfim, a lista dos problemas económicos que carecem de decisão política é enorme. Acima fica uma pequena amostra. A meu ver, a indisponibilidade da europa para mudar o actual quadro, acabará por ditar o fim do euro e talvez mesmo da união. Neste contexto, nenhuma das (necessárias) mudanças que os portugueses possam decidir produzirá resultados significativos sem mudanças estruturais na Europa.

    Cumprimentos,
    Paulo Coimbra

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  5. Boa tarde, Paulo,

    Mais uma vez agradeço a sua resposta e, sem picardia, posso dizer que estou de acordo com quase tudo o que escreveu agora.
    Mas o facto de a Europa não estar a corresponder àquilo que tivemos a impressão que poderia vir a ser não resolve o nosso problema, nem financeiro (a dívida) nem económico (a incapacidade de crescer, e de a pagar). E constatar que ficaríamos bem melhor se a Europa fosse mais parecida com o nosso ideal e menos com o que é na realidade, também não.
    Não domino os aspectos técnicos para poder estimar os custos de reestruturar a dívida, ou mesmo de falhar pagamentos, mas considero que são hipóteses que não devem ser colocadas de lado sem uma avaliação séria. Afinal, em finanças, juro paga risco e, se remuneramos os nossos credores, é para assumirem o risco de isto poder acontecer, e não para ganharem mais com a mesma garantia de receber que se emprestassem à Alemanha. Uma das consequências seria certamente deixarmos de conseguir crédito, mas esta situação já aí está mesmo sem termos falhado ou reestruturado. Como bonus, se conseguíssemos viver sem crédito, poderíamos resolver os contratos com as agências de notação que nos devem custar uma boa nota. Queixarmo-nos delas também não nos resolve o problema, porque são os credores, e não os devedores, que estão dependentes da qualidade das suas notações: se erram por optimismo, os credores tramam-se porque emprestam à confiança a quem não tem capacidade de lhes pagar (foi o que aconteceu na crise financeira); se erram por pessimismo, os credores também são prejudicados, porque são motivados a desviar os seus investimentos para devedores de melhor notação mas maior risco.
    Quanto ao problema económico, a receita do FMI contribui certamente para a sua resolução, o que não significa que o resolva. Baixar custos de produção permite devolver competitividade à economia. Mas também permite abusos, nomeadamente se as empresas apanharem boleia da redução salarial sem ajustarem a oferta nem a capacidade de produção, limitando-se a lucrar mais sem criar emprego. Por isso, sou de opinião que a esquerda poderia prestar um inestimável serviço no ajustamento que se segue, identificando atentamente oportunidades de distribuir de forma mais equitativa os sacrifícios, ou os desalinhamentos dos sacrifícios com os objectivos que os fundamentam, se participasse no processo em vez de se colocar à parte dele.
    É pena que afinal a nossa economia não consiga sustentar o padrão de vida que parecia oferecer que, mesmo entre os mais baixos da UE, era muito superior aos que conhecemos sesde sempre? É. Mas não é com fugas em frente que invertemos isto.

    Cumprimentos

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  6. Manuel Vilarinho,

    Sim, reestruturar a dívida parece-me inevitável. E volto ao princípio "(...) A redução da despesa em períodos de desemprego elevado é um erro. Os defensores da austeridade prevêem que esta produza dividendos rápidos sob a forma de aumento da confiança económica, com poucos ou nenhuns efeitos negativos sobre o crescimento e o emprego; o problema é que não têm razão. Cortar na despesa numa economia em recessão acaba por ser contraproducente nem que seja em termos fiscais: quaisquer poupanças na despesa são anuladas pela redução da receita fiscal resultante da contracção da economia. É por isso que a estratégia correcta é emprego primeiro e défice depois (...)” Ou seja, em resultado das políticas recessivas, o crescimento económico em Portugal (a falta dele) é hoje incapaz de satisfazer um serviço da dívida onde pesam demasiado os juros especulativos impostos por aqueles que também impuseram este caminho sem saída.

    Este tipo de problema tem uma configuração semelhante um pouco por toda a Europa http://duncanseconomicblog.wordpress.com/2011/04/07/portugal-a-warning-for-osborne/.

    Quanto à questão da ‘realidade’ e do ‘ideal’, como já lhe disse, na minha opinião, a realidade que temos hoje é a ideal para o centro da europa mas é péssima para os restantes. É isso que tem de ser mudado. É uma realidade de construção política e o que é político não é natural e pode e deve ser mudado de acordo com as opções das pessoas.

    Quanto ao FMI contribuir para a resolução dos nossos problemas, como antecipará, não posso estar em maior desacordo. O FMI ‘ajuda’ os credores. As políticas do FMI têm sido de resto a inspiração para as políticas aplicadas desde 2009 e que geraram os resultados que se vêm.

    Quanto ao papel da Esquerda nesta crise. À minha muito pequena escala, tudo farei para se evitem sectarismos e se juntem forças. É urgente impedir a venda a preços de saldo dos activos portugueses; é necessário defender a protecção social e os serviços públicos; é necessário travar a ofensiva contra o trabalho. É necessário mostrar na rua, com os Irlandeses, os Gregos, os Espanhóis e os outros que hão-de vir que não estamos dispostos a sacrificar-nos pelos lucros deles.

    Cumprimentos,
    Paulo Coimbra

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