quarta-feira, 6 de abril de 2011

A responsabilidade de tomar posição

Em Indignai-vos Stéphane Hessel cita Sartre: "Vocês são responsáveis enquanto indivíduos"; e acrescenta:
"É uma mensagem libertária. A responsabilidade do homem que não se pode remeter nem a um poder nem a um deus. Pelo contrário, é preciso empenhar-se em nome da sua responsabilidade de pessoa humana."
Vale para mim. Perante a miséria que me rodeia, perante os discursos das "regras do mercado", a repetida inevitabilidade dos esforços que são para todos, enquanto as vendas dos bens de luxo não cessam de crescer, o sempre repetido cliché de que "desempregados são só os que não querem trabalhar", é minha responsabilidade, como ser humanos tomar posição.

Não agir, deixar passar é também tomar a posição do mais forte, "não levantar ondas", diz-se. "Não levantar ondas" significa obedecer às regras impostas, calar perante a iniquidade das desculpas que nos são dadas e repetidas todos os dias pelos mesmos meios de comunicação.

Mas a responsabilidade é também de todos os que fazem, repetem ou vivem à luz do discurso do mercado. Usar o mercado como argumento parece simples: lançam-se uns números a meio do discurso — "os números são indesmentíveis". Qualquer bom matemático dirá que nem a Matemática é uma ciência exacta, que até nesse "paradigma da exactidão", a única certeza é de que as conclusões de hoje serão questionadas amanhã. O mercado é pouco mais fiável e científico que um jogo de azar — com algum cálculo financeiro pelo meio, certo — mas onde seres humanos agem com as mais diversas motivações: emocionais (de pertença a um grupo, de identificação com uma marca, um clube, uma nacionalidade, uma cidade, etc.); aparentemente racionais baseadas em informações que podem estar certas (ou não); crenças de toda a sorte, etc.

No entanto, esse "mercado" apenas os demite de reflectir e de agir enquanto seres humanos, enquanto membros da sociedade. SÃO RESPONSÁVEIS, porque apenas o "simples" acto de chutar para o mercado É TOMAR POSIÇÃO. É tomar a posição de demissão do raciocínio, da sua condição humana, do seu papel social.

Cabe-me a viver este tempo, nestas condições. Até aqui chegar assisti às mais diversas Utopias tornar-se realidade. Todas as anteriores foram-me contadas e parecem tão inacreditáveis como as que vi e vejo ainda todos os dias. Caiu o muro de Berlim, Timor é livre, acabou o apartheid, Mandela e Xanana foram libertados e eleitos Presidente da África do Sul e de Timor, um governante espanhol que mentiu contrariou as sondagens e perdeu umas eleições num fim-de-semana — a Espanha inteira não suportou tal desprezo pela Galiza. O Tribunal Penal Internacional foi criado e está a funcionar. Não venham dizer-me que não é possível, porque em menos de 40 anos já tudo foi possível!

Seria desumana, irresponsável, estaria amputada da minha condição humana se não lutasse agora.

Sobretudo por uma simples mentira de algibeira, como o tal "mercado absoluto e científico".
Não conheço soluções milagrosas nem messias omnipotentes. Sei apenas que não posso demitir-me de pensar, de ler, de procurar, de querer saber mais e de me indignar — ao ponto da raiva — com a iniquidade que vejo e que sinto. Com a desigualdade crescente instalada em Portugal e na Europa, onde não podem crescer défices nem inflacções, mas podem galopar fendas sociais, miséria, amputações de direitos humanos sem que qualquer Tratado com nome de uma bela cidade venha socorrer-nos. Sei que a Humanidade — a Humanidade de um só Ser Humano — vale mais que dois ou dois mil, ou mesmo dois mil milhões de tostões, isso sei. Por isso, BASTA!

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